Revisionismo envergonhado
O PT não aceitou a anistia, não votou em Tancredo nem assinou a Constituição
Luiz Paulo Vellozo Lucas (*)
O período de vinte anos, dez anos antes e dez anos depois da queda do Muro de Berlim em 1989, foi marcado por uma profunda revisão programática empreendida pelos partidos de esquerda. O aggiornamento, como chamavam os comunistas italianos, compreendia a aceitação da democracia como valor universal, a economia de mercado e o estado de direito como instituições da democracia a serem respeitadas e aperfeiçoadas. Era preciso trocar a revolução por uma permanente busca de reformas.
Com a boca torta pelo uso do cachimbo da luta armada, o PT não aceitou a lei da anistia, não votou em Tancredo Neves e não assinou a Constituição de 1988. Perto de chegar ao poder com a eleição de Lula, o PT edita a “Carta aos Brasileiros” em 2002 comprometendo-se a manter as regras do jogo na economia e no mercado financeiro e, assim, governa o Brasil por dois mandatos sem que se saiba ao certo se o PT afinal completou ou não a travessia da ponte do revisionismo. Os sinais são ambíguos e contraditórios.
O Plano Nacional de Direitos Humanos, assinado e já, em parte, desautorizado pelo Presidente Lula, é um desses momentos em que o PT parece querer redimir-se da prática de governo populista e fisiológico, e da política econômica conservadora, com um pacote de intenções, e ameaças de rupturas revolucionárias.
A principal razão de ser do estado democrático é a garantia dos direitos humanos. Assim está escrito no primeiro artigo da Constituição alemã redigida depois da II Guerra sob a liderança de Konrad Adenauer. O texto do PNDH é uma reinterpretação da própria Constituição brasileira e do estado de direito.
Com seus “conselhos”, “assembleias” e consultas diretas, o PT parece querer reviver a palavra de ordem que levou os bolcheviques ao poder na Rússia de 1918: “Todo poder aos soviets de operários, soldados e camponeses”. Soviet quer dizer conselho em russo. Lula mandou mudar o texto, e aconselhou sua candidata a sair deste debate quadrado para quem quer disputar a presidência.
Sem definições de natureza estratégica claras sobre democracia e papel do estado, o PT segue governando o país sob a inspiração de um líder tornado mito. A popularidade de Lula, expressa em competitividade e anseio de se tornar imbatível eleitoralmente, sobrepuja a necessidade de um projeto para o Brasil. A luta a qualquer custo pela perpetuação no poder, unidos pelo carisma e pelos votos de Lula, os petistas e seus aliados puxam para lados contraditórios a ação do governo, confundindo os brasileiros e o mundo.
Governar com base ampla pressupõe pactuar os eixos em torno do qual a aliança se estabelece; os pontos de convergência; a estratégia comum. O governo do PT não tem isso e assenta sua governabilidade num pacto de ocupação de espaços de poder na máquina pública entre forças políticas com visões de mundo conflitantes como o agronegócio e o MST. A confusão causada pelo 3º PNDH é a cara do governo do PT.
(*) Luiz Paulo Vellozo Lucas é deputado federal (PSDB-ES) e presidente do Instituto Teotonio Vilela. Artigo publicado no jornal "Gazeta de Vitória" em 18 de janeiro. Foto: Du Lacerda
18 de jan. de 2010
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