9 de mar. de 2010

Governo precisa agir

Cadastro de Desaparecidos não deve ser mero regulamento

Vanderlei Macris (*)

Integrar a CPI Destinada a Investigar as Decorrências do Desaparecimento de Crianças e Adolescentes no Brasil é estar sensível a um problema social que causa dor inexplicável às famílias que vivem essa fatalidade. O desaparecimento de crianças e adolescentes é problema que ocorre em todo o mundo, mas não temos, no Brasil, uma atenção mínima para o registro e a investigação desses casos. Constatamos esse descaso durante os trabalhos da CPI e, enquanto lutamos para modificar a realidade, deparamos com o jogo político que se tornou a aprovação do Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Desaparecidos.

Assim que foi instalada a CPI na Câmara dos Deputados (agosto de 2009), foi comprovado que não há nenhuma comunicação entre as polícias nem cadastro que interligue as demais instituições que atuam nesse escopo. Ou seja, descaso maior não há, já que até um registro nacional de automóveis existe. Nas audiências realizadas pela comissão, ficou evidenciada a necessidade da implantação do cadastro nacional de desaparecidos.

De acordo com os peritos no assunto, quanto mais cedo se inicia uma investigação, maior é a chance de encontrar a pessoa com vida. A oportunidade cresce consideravelmente se as delegacias do país estiverem atentas ao indivíduo procurado. O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, desde 2005, que a investigação do desaparecimento deverá ser “realizada imediatamente após notificação aos órgãos competentes, que deverão comunicar o fato aos portos, aeroportos, Polícia Rodoviária e companhias de transporte interestaduais e internacionais, fornecendo-lhes os dados necessários à identificação do desaparecido”. Mas de nada adianta a lei se não houver a infraestrutura para a comunicação.

Após a Lei nº 12.127, de 17 de dezembro de 2009, que cria o cadastro nacional, ser sancionada pelo presidente da República, até agora nada de prático foi feito. Ou seja, do fim do ano passado para fevereiro de 2010, milhares de pessoas já desapareceram no Brasil e de concreto para solucionar o problema não foi feito nada pelo governo federal, a não ser muita propaganda política. Sinto dizer, mas a Lei nº12.127 não passa de um regulamento firmado.

Próximo a Brasília (DF) temos diversos casos de crianças e adolescentes sumidos nos últimos 60 dias. As mães deles nos relataram a frieza com que são tratadas ao irem às delegacias. Quando um agente cumpre a lei e registra o caso, o inquérito emperra porque a polícia não tem estrutura para a investigação.

Só em Luziânia (GO), entorno da capital federal, seis adolescentes desapareceram e a polícia diz não ter pistas dos episódios. O pior foi a constatação de que as investigações se iniciaram depois do terceiro incidente, quando já se passavam 15 dias do primeiro desaparecimento.

Na CPI, estamos na fase final do diagnóstico e, por meio dos depoimentos já realizados, conhecemos algumas ações positivas no Brasil, como a do Serviço de Investigação de Crianças Desaparecidas (Sicride), do Paraná, e da Delegacia Especial de Proteção à Crianças e ao Adolescente do DF, além de outros trabalhos importantes desenvolvidos nos estados de São Paulo e Alagoas.

A exposição do professor da Universidade Federal de Alagoas Luiz Antônio da Silva na CPI demonstrou a diferença do Brasil com outros países em relação aos desaparecidos. Segundo o professor, a Inglaterra, a Austrália e os Estados Unidos têm atenção e foco nos casos dos desaparecimentos; “o Brasil, não”.

Com base nas informações do secretário executivo do Conselho Nacional da Criança e do Adolescente (Conanda), Benedito Rodrigues dos Santos, e com análise no Sistema Integrado de Administração do Governo Federal (Siafi), percebemos que as ações do governo federal em relação à criança e ao adolescente são, no mínimo, inexpressivas. O governo não chegou a utilizar 1% do que estava destinado ao Fundo Nacional das Crianças e Adolescentes (FNCA) em 2009.

Vale destacar que o bem-estar da criança e do adolescente é de responsabilidade da família, da sociedade e do Estado. Dessa maneira, é preciso trabalhar, de modo a criar uma rede nacional de crianças e adolescentes desaparecidos, alicerçados em verdadeira política pública, com órgãos que sejam comprometidos e responsabilizados — e programas que efetivamente sejam executados.

(*) Deputado Federal pelo PSDB de São Paulo e vice presidente da CPI Destinada a Investigar as Decorrências do Desaparecimento de Crianças e Adolescentes no Brasil. Artigo publicado no "Correio Braziliense" em 09/03/10.

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